As instituições educacionais são lugares em que é possível aprender a planejar a vida e o futuro? É importante conversar com jovens estudantes sobre os processos que envolvem a "escolha" de uma profissão? Por um lado, há elementos de ordem subjetiva. Por outro, existem questões objetivas que dificultam esse processo. Nas sociedades contemporâneas, o racismo estrutural e as desigualdades sociais que afetam diretamente as trajetórias e oportunidades na vida dos jovens, sobretudo de grupos de jovens imigrantes, afrodescendentes, dentre outros. Não devemos amar a miséria, aliás, devemos combatê-la, sobretudo criando trabalho, trabalho digno, como o Papa Francisco enfatizou em seu discurso de 24 de setembro de 2022, em sua visita a Assis, por ocasião do evento Economy of Francesco. Será que o fato de ser imigrante impacta na trajetória educacional do jovem? Responder tal questão e equacioná-la, não é tarefa fácil, sobretudo se tal desafio se realiza sem que os jovens contem com espaços mediadores, capazes de informá-los sobre o seu entorno, isto é, acerca do contexto social em que vivem. Jovens de camadas sociais empobrecidas, em especial, afrodescendentes, têm encontrado em suas trajetórias educacionais maiores obstáculos para a construção de um projeto de vida adulta que envolvem escolarização e trabalho, como podemos observar no estudo de Cristina Roldão, “Fatores e perfis de sucesso escolar “inesperado”: trajetos de contratendência de jovens das classes populares e de origem africana”.
Observa-se que o racismo e a discriminação sofrida por imigrantes são uma preocupação das sociedades contemporâneas, principalmente nos países da União Europeia (EU). Estudos mostram que nos Estados-membros da EU, uma maioria de respondentes vê a discriminação dos imigrantes como um obstáculo à sua integração, principalmente no que se refere a inserção laboral, postos de trabalho, e na procura de emprego. Nesta direção, o “Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação 2021-2025" e iniciativas da ONU, como, por exemplo, a Resolução (68/237), que ao proclamar a Década Internacional de Afrodescendentes 2015-2024, propõe políticas e programas de combate ao racismo em todos os setores da sociedade. No âmbito educacional, em especial, propondo a inclusão precisa da história e contribuição de afrodescendentes nos currículos educacionais.
Compreende-se que é fundamental reconhecer a contribuição da imigração para responder aos desafios que se colocam com os cenários demográficos, considerando uma contribuição urgente para o debate sobre um futuro mais sustentável e com equidade, como tem difundido Agenda 2030 (ODS), constituída por 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), dentre outros objetivos, “garantir o acesso à educação inclusiva, de qualidade e equitativa, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos”. E “promover o crescimento econômico inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho digno para todos”.
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Entende-se, por um lado, que a imigração é crucial para o desenvolvimento econômico e reforçar grupos populacionais mais jovens e ativos para o trabalho. Por outro lado, observa-se que o campo educacional tem vital importância neste processo, pois a escola tem dentre outros objetivos, para além da educação formal, a socialização desse segmento para facilitar a adaptação à sociedade local, (inter)nacional e contribuindo para a construção de uma sociedade com equidade.
Os Estados e a sociedade civil devem ter uma preocupação com o contexto dos jovens, considerando as desigualdades sociais, o combate a discriminação e ao racismo, o cotidiano da prática familiar e escolar, para promover um projeto de vida adulta a eles, em especial, na orientação e escolha profissional, principalmente os mais vulneráveis. É importante também o fortalecimento da autoestima dos jovens e auxiliar as instituições escolares, com o propósito de prepará-los para o ingresso na universidade, ensino profissionalizante e/ou mercado de trabalho, compreendendo o seu entorno social.
É importante dialogarmos com as dimensões da exclusão social, abrangendo as dimensões objetiva, referente à desigualdade social; ética, referente às injustiças sociais; subjetiva, referente ao sofrimento ético-político produzido pela exclusão social. Além de incentivar perspetivas interdisciplinares para a análise do racismo, articulando a Educação (currículo educacional, formação de jovens, orientação educacional, escolhas profissionais);Ciências Sociais (imigração, adolescência/juventude). Deste modo, visando atender possíveis inquietações desse grupo populacional com vistas a um projeto de vida adulta, conectando o ensino aos seus planos de futuros, sejam eles de inserção profissional e/ou de prosseguimento dos estudos na universidade, principalmente do jovem imigrante. Visto que muitos jovens não têm a oportunidade de almejar ou estar incluído em universidades de primeira linha, privilegiadas pela comunidade acadêmica. À universidade que se comprometeu a formar as novas gerações, seria um desperdício pensá-la apenas para perpetuar o atual sistema elitista e desigual do mundo com o ensino superior que continua a ser um privilégio de poucos, como destacou o Papa Francisco no Encontro com jovens universitários por ocasião da Jornada Mundial da Juventude em Lisboa no dia 3 de agosto de 2023, em Lisboa, Portugal.
Nas sociedades contemporâneas, jovens expressam inseguranças e angústias ao falar das expectativas em relação ao futuro; por isso, é importante ampliar o diálogo com este grupo juvenil e com o seu entorno. Estamos diante de uma mesma geração quando os sujeitos em alguma medida vivenciam espaços-tempos comuns de sensibilidades, saberes, memórias, experiências históricas e culturais, em especial, os de setores mais vulneráveis e racializados, porque a eles incide diretamente o aumento da sensação de medo e insegurança e das incertezas quanto a vida futura, e presente, até porque estão mais expostos entre-lugares.
Compreende-se que a ampliação de conhecimentos sobre as diferentes realidades juvenis, e de suas necessidades insatisfeitas, motivações e subjetividade em curso, especialmente aquelas relacionadas com os jovens imigrantes e racializados, os quais, maiores dificuldades enfrentam para a realização de “escolhas” e alternativas e projetos autônomos.
Marcos Antonio Batista da Silva - Doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pós-doutorado no Centro de Estudos Sociais, Universidade de Coimbra (Projeto 725402 - POLITICS - ERC-2017-2023).